Este hino de Lucas 1:67-79 é conhecido historicamente como “Benedictus”, por causa de suas primeiras palavras: Louvado seja… Nele, Zacarias profetiza em forma de canção, e louva a Deus por sua poderosa salvação (vv. 68-69). Zacarias é sacerdote e conhece as Escrituras hebraicas. Ele sabe que as promessas de Deus aos profetas estão se cumprindo, e a aliança que Deus fez com Abraão está sendo lembrada (vv. 70-72 cf. Gn 22:16-18). E porque ele tem tanta certeza disso? Por causa da experiência que teve. Um anjo do Senhor apareceu a Zacarias e lhe revelou que teria um filho, mesmo sendo já velho, e que este menino seria o precursor do Messias, a tanto esperado pela nação (Lc 1:5-25). As palavras deste cântico vêem exatamente depois que estas palavras se cumprem, e seu filho nasce (Lc 1:57-66). Deus, de fato, estava resgatando seu povo! Deus resolveu livrá-lo! Deus resolveu promover uma poderosa salvação!
A pergunta que gostaríamos de responder é: com quais objetivos Deus fez isso? Quando ele resgatou seu povo, ele o fez com que propósitos? Zacarias nos ajuda nesta resposta, em seu cântico. Segundo lemos, ele nos resgatou para o cultuássemos (Lc 1:74 – ARA). Temos no original a palavra grega latreuo, que diz respeito a um serviço que oferecemos a alguém. É a palavra traduzida por “culto” algumas vezes no Novo Testamento. O culto é um serviço que oferecemos a Deus. Oferecemos atos de adoração a Ele, com a voz e com a vida. Neste texto, o culto é uma resposta ao resgate e a libertação poderosa que Deus operou em nossa vida.
Partindo desta perspectiva, quando perguntamos para alguém o que esta pessoa achou do culto, estamos perguntando o que ela achou do serviço que prestamos a Deus, ou se ela entende que prestou culto adequadamente. Fomos libertos por Deus para cultuá-lo. E como deve ser este culto? Este texto nos oferece quatro respostas.
1. Fomos libertos para cultuar sem medo, Lc 1:74b
Deus nos libertou para que pudéssemos cultuá-lo como gente livre. Não sei se você conhece gente oprimida pelo medo. Não somos mais escravos do pecado. Quando Deus nos libertou, cessou a condenação (Rm 8:1). Não precisamos adorá-lo com pavor. Não servimos um deus com chicote na mão pronto a nos punir a cada vez que pisamos fora da linha. Se esta é a nossa concepção de Deus, ela precisa mudar. Sirva-o com alegria e sem pavor. Sem medo do seu passado. Sem medo dos seus pecados. Quem experimentou a poderosa salvação anunciada por Zacarias foi perdoado por Deus. Teve suas dívidas cravadas na cruz.
2. Fomos libertos para cultuar em santidade, Lc 1:75a
Cultuar sem medo não é cultuar de qualquer modo. Na sequência, o texto fala sobre cultuar “em santidade”. O que é cultuar em santidade? É cultuar levando a sério a vontade de Deus. É cultuar sem brincar com o pecado. Santidade tem a ver com tornar-se mais semelhante a Cristo. A ideia da palavra aqui é cultuar a Deus sendo fiel àquilo que ele exige de nós. Quanto mais nos empenhamos em ser fiéis ao que ele exige de nós, mais semelhantes a Cristo nos tornamos. Contudo, esta fidelidade deve brotar do nosso amor a Ele e não do nosso medo. Percebeu que “cultuar com santidade” vem depois de “cultuar sem medo”? Isto não é aleatório! Isto é o evangelho! Eu posso me esforçar para agradar a Deus porque sou livre, e devo fazer como gente livre. Minha motivação não é o pavor do que me pode acontecer se eu não fizer isso, mas meu amor por aquele que se entregou na cruz para perdoar meus pecados e me dar salvação!
3. Fomos libertos para cultuar em justiça, Lc 1:75b
A palavra “justiça” está ligada a integridade. É a pessoa que é como deve ser. Não podemos pregar uma coisa e viver outra. Mas qual a diferença de justiça e santidade? Basicamente, é que santidade tem a ver comigo mesmo e justiça tem a ver como me porto em relação ao próximo. Fomos libertos para que pudéssemos tratar corretamente o nosso próximo. Não podemos cultuar a Deus na igreja e oprimir nosso funcionário no trabalho, e etc. O profeta Amós fala de gente que cultuava a Deus solenemente, mas não vivia a vontade de Deus no dia-a-dia. Deus pediu, através do profeta, para que eles não apresentassem mais louvores a ele (5:23). É isso mesmo! Deus se recusou a ouvir louvores de quem se apresentava solenemente no culto, mas no dia-a-dia tinha as mãos sujas com a injustiça contra o pobre e desfavorecido. Não estamos afirmando, à luz destas colocações, que Deus só recebe louvor de gente perfeito. Não somos perfeitos. Enquanto Jesus não vier segunda vez, nós não seremos nada mais do que pessoas libertas que lutam contra o pecado, e que, mesmo não tendo o pecado como meta, pecam. Nós pecamos. Contudo, é estranho conceber a ideia de alguém que foi liberto por Jesus e não está nem ao menos numa luta por integridade, numa luta por fazer a vontade de Deus, mesmo a despeito dos seus erros.
4. Fomos libertos para cultuar continuamente, Lc 1:75
O texto diz que fomos libertos para cultuarmos: “na presença dele, todos os dias da vida”. Veja que verdade fenomenal! Culto não é algo que faço apenas três vezes na semana quando vou à igreja. Culto não é um ritual metricamente planejado, que executo quando estou reunido com outros adoradores. É também, mas não só. Zacarias profetiza que Jesus veio nos libertar para que o cultuássemos na presença dele todos os dias da vida! Culto é algo que faço o tempo todo! Minha vida deve ser um culto a Deus! E não estamos sugerindo que você deve viver com as mãos para cima e com os olhos fechado, glorificando, 24 horas por dia. Não! Quando você come e bebe (1 Co 10:31), Deus é glorificado. Quando você trabalha de maneira honesta, Deus é glorificado. Quando você cria seus filhos do jeito de Deus, Ele é glorificado! Quando você namora, segundo os padrões bíblicos, Deus é glorificado! Quando você cuida do mundo criado por Deus, Ele é glorificado! Entendeu? Em cada pequeno detalhe da nossa vida, Deus pode ser glorificado, quando fazemos para ele!
Outra coisa. Não “entramos na presença de Deus” quando vamos à igreja, quando vou a um monte, quando vou para um retiro: vivemos diante dele! Jesus disse que estaria conosco todos os dias (Mt 28:20); o Espírito Santo habita em nós (1 Co 3:16). Em que momento da nossa vida Deus não está conosco? Em nosso relacionamento com Deus não temos uma chave de “liga e desliga”. Agora cheguei a igreja, vou ligar a “chave” e “entrar na presença de Deus”. Ou, agora estou tomando um ônibus para ir ao trabalho, vou “desligar” a chave. Não existem lugares mais sagrados do que outros. Nosso coração, nossa vida, é o altar, o lugar onde Deus opera, vive, ministra. Então, quando você chegar à igreja para adorar a Deus no culto coletivo, saiba que este culto deve ser uma continuação do seu culto individual. Não estamos entrando na presença de Deus, estamos continuando nossa experiência diária de culto, desta vez com outros adoradores.
Você pode louvar a Deus junto com Zacarias por poder desfrutar deste privilégio? Bendito seja o Senhor, por tão poderosa salvação!